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Memórias, fotografias e a Tailândia.

cartaz do filme

Cartaz do filme.


“título original: (Lung Boonmee Raluek Chat)
lançamento: 2010 (Tailândia, Inglaterra)
direção:Apichatpong Weerasethakul
atores:Thanapat Saisaymar, Sakda Kaewbuadee, Jenjira Pongpas.
duração: 114 min
gênero: Drama
status: Em cartaz

Sinopse: sofrendo de insuficiência renal, Tio Boonmee (Thanapat Saisaymar) resolveu passar os últimos dias de sua vida recolhido em uma casa perto da floresta, ao lado de entes queridos. Durante um jantar com a família, o espírito de sua esposa falecida aparece para ajudá-lo em sua jornada final. A eles se junta Boonsong, filho de Boonmee, que retorna após muito tempo metamorfoseado em outra forma de existência. Juntos, eles percorrerão o interior de uma caverna misteriosa, onde Boonmee nasceu em sua primeira vida.”
Fonte:http://www.adorocinema.com/filmes/tio-boonmee-que-pode-recordar-suas-vidas-passadas/

Antes de começar esse resenha, tenho que mostrar algumas igualdades que vão facilitar a minha escrita e a sua leitura:
“Tio Boonmee, Que Pode Recordar Suas Vidas Passadas” = “Tio Boonmee”.
“Apichatpong Weerasethakul” = “Joe”.
Nenhum animal ou regra matemática foi ferido nessa igualdade. E o próprio diretor autorizou as pessoas do ocidente a chama-lo de “Joe”. Senão eu ia começar a chamar ele de “Chacha”.

Joe é o Guimarães Rosa da Tailândia. Lógico que essa afirmação pode estar completamente errada, mas a simpatia que eu tenho pelos dois é a mesma, e talvez seja um mecanismo da minha mente tentar comparar dois artistas que eu gosto tanto.
Não conheço quase nada da cultura tailandesa, e sou não sou um mestre na obra de Guimarães Rosa, mas existem sim semelhanças entre os dois. Desde coisas pequenas, como o boi, tão presente na obra do escritor mineiro, aparece na primeira cena do filme do realizador tailandês. Uma cena em que o boi foge da arvore onde está amarrado e foge para floresta. Outra igualdade entre os dois é o “realismo fantástico”, uma magia que aparece como se fosse a coisa mais normal do mundo. Além da criação de uma linguagem totalmente nova dentro de própria linguagem. Rosa na escrita, Joe no cinema.
Para mim os dois são planos paralelos com infinitos pontos de ligação, mas tem um ponto em principal que eu quero focar (e depois aprofundar mais ainda): como os dois misturam complexidade e simplicidade.
Mas isso não quer dizer que você pode assistir à “Tio Boonmee” comendo uma fatia de “quejin di minas” e tomando café quente. O filme se afasta de todos os padrões cinematográficos que estamos (ou eu estou) acostumados a ver.
E é agora que realmente vamos começar a crítica.

Em uma das cenas mais comentadas desse filme, o fantasma da esposa falecida de Boonmee e seu filho perdido (agora em forma de um macaco mágico) aparecem na mesa de jantar. É uma cena muito importante para todo o filme. Nessa cena o filho-macaco conta porque estava naquela forma. E o motivo principal é a fotografia.
Uma fotografia que ele tirou e viu na foto após ser revelada, mostra o “macaco fantasma”, a criatura que ele próprio se tornou depois. Uma obsessão parecida com a do personagem de “Blow Up”.
o que você está vendo?
A fotografia no filme representa duas coisas: representação da memória das pessoas e também uma representação de como funciona o tempo dentro do filme. Quando Tio Boonmee está para morrer ele recorda de suas vidas passadas enquanto várias fotos são mostradas na tela. Quando o monge e a genra de Boomne deixam o quarto do hotel e vêem a si mesmos sentados assistindo a TV, eles vêem o recorte de outra ramificação tempo. Como uma foto.
“Tio Boonmee” é um filme sobre o cinema e são várias as referencias a outros filmes, principalmente ao filme “La Jetée” de Chris Marker, em que a fotografia também é um símbolo das lembranças que temos.
Mas não é só isso. O filme tem diversos de outros temas ocultos como o vulto na foto e talvez todos nós vamos ficar paranóicos em tentar achá-los, e também nos vamos nos tornar macacos fantasmas.
E é o que eu mais gostei no filme, a magia se infiltrando levemente na realidade, a forma como o tempo é tratado de uma maneira totalmente diferente. As coisas não acontecem de forma linear, mas como se tudo pudesse ser observado de fora, ou como se todos os eventos estivessem num espaço tridimensional, quem sabe um álbum de fotografias.
Tem muitos outros detalhes do filme que eu não compreendi/não cabem nessa “crítica”.
“Tio Boonmee” é um filme para ver muitas e muitas vezes, discutir com os amigos no bar. E teve gente falando que era um filme chato…

Nota 9/10.

Fracasso

Poster do filme


Sinopse: Auxiliadora (Mariah Teixeira) é uma jovem de 16 anos explorada e mantida dentro de casa pelo avô Heitor (Fernando Teixeira) em um pequeno povoado na Zona da Mata pernambucana. Durante algumas noites, o avô leva a garota ao posto de gasolina para expô-la nua a troco de alguns reais. Na cidade, Everardo (Matheus Nachtergaele) e Cícero (Caio Blat) promovem orgias violentas na casa de Dona Margarida (Conceição Camarotti), onde moram algumas prostitutas.

“Baixio das Bestas” é um filme que funciona como uma armadilha. Tudo serve pra você sair pensando que aquele é o pior filme que você já viu. Cenas “fortes”, muito palavrão, nudez. Personagens não têm nenhuma profundidade, planos, e sustentam sua máscara de maldade como as fantasias do maracatu. Eu pensei “meu deus que filme clichê!”. Como sempre estava enganado. O filme tem tudo isso, mas só que é tudo de propósito.
Eu acho que realmente existem pessoas como o avô de Auxiliadora, falsos moralistas, e garotos de classe média que cometem aqueles atos de brutalidade com mulheres.
Mas é importante observar como são construídos os personagens e seu mundo.
É tudo um experimento, um experimento já feito para fracassar.
Tudo no filme foi feito para dar errado, são personagens tortos, num mundo torto só esperando as coisas virarem ruínas. O diretor sempre filma cenas se repetindo, da mesma forma, mudando apenas pequenos detalhes, e repete tudo de novo. E nada muda.
Ninguém evolui e o canavial continua queimando lá atrás.
É um filme científico, para estudar a decadência das pessoas num ambiente que está apodrecendo. Nós, como o diretor-cientista, estamos apenas observando o processo de decomposição daquele mundo. E tudo queima no final. Até os personagens percebem isso, com algumas declarações metalingüísticas, como quando um dos senhores que participa do maracatu fala para um homem que esta cavando uma cova: “Esse é o cheiro da podridão do mundo”.
Mas é possível fazer um filme como um experimento científico? Isso é “artístico”?
E a resposta mais uma vez vem de um personagem que já compreendeu sua condição de experimento: “É que no cinema você pode fazer o que tu quer”.
Apesar de enganar a gente com a idéia de estar fazendo uma crítica social filmando algo “que realmente acontece”, na verdade o filme crítica de uma forma bem diferente, cria um micro-cosmo que logo será destruído, levemente semelhante a observar a formação de anti-matéria por um acelerador de partículas. E é isso que são os personagens, não existe nenhuma pessoa daquele jeito, tão superficial, em condições normais. Deve se criar todo um aparato para eles existirem. E foi isso que o diretor fez.

Nota 7/10

Mickey Eye is watching you!

Todo mundo gosta de bad-guys, principalmente nos quadrinhos. Personagens como Marv (“Sin City”) ou mesmo o Justiceiro, com seus métodos violentos, atitudes casca- grossa e frases de efeito. Mas pelo visto Grant Morrison estava cansado desses personagens…
“Seaguy” conta a história do personagem de mesmo nome da HQ, que vive num mundo utópico, em que não existem mais perigos. Todos vivem teoricamente felizes, sem crimes, assaltantes ou vilões para perturbar a paz. Quase todos os Super-Heróis morreram em combate com o que seria o mau supremo, o Anti-papai. Os que restaram se aposentaram e vivem de memórias do passado.
Nesse ambiente Seaguy vive de jogar xadrez com a morte (uma clara citação ao filme “Sétimo Selo”), e assistir o programa do suspeito Mickey Eye. E para impressionar uma mulher barbada, uma guerreira que busca aventureiros, Seaguy parte em busca de alguma aventura que talvez ainda exista nesse mundo. E ele encontra.
Tijolos com hieróglifos começam a cair da lua, e isso parece a Seaguy e seu parceiro (um peixe voador e fumante de charutos) a oportunidade perfeita para entrar em uma aventura, e conseqüentemente impressionar a mulher barbada. Mas essa suposta queda de pedras lunares arrasta diversos perigos consigo…
E isso é um das melhores coisas desse quadrinho. Morrison encadeia as ações dos personagens e as ações sobre os personagens de um modo totalmente inovador. Muitos falam que algo surrealista. Mas eu discordo. Assim como “Patrulha do Destino”, Morrison quer nos trazer uma espécie de estranheza romântica, mostrando que o mundo não é como a gente imagina e vê, mas ele não mostra isso com uma porrada na sua cara (como é o caso de Morpheus contado para Neo que ele é só uma pilha), mas sim com uma história muito bonita e poética. Além disso, o ritmo da história é muito rápido, as situações acontecem em grande velocidade. Parece até que a história foi “condensada”.
E Seaguy é um personagem a parte no mundo dos quadrinhos. Ele não tem poder nenhum, não conhece muito bem os oficio de ser um super-herói, e é um pouco ingênuo. Mas ao mesmo tempo ele é um romântico, carismático, simpático e muito inteligente.
A amizade dele com Chubby Da Chonna (o peixe voador que eu falei) é outra jóia rara que eu vi nesse quadrinho. Duplas aparecem em HQs e na literatura desde o tempo do guaraná com rolha. Batman e Robin, super-gêmeos (tá essa foi tosca), Sherlock Holmes e Watson, Dom Quixote e Sancho Pança. Mas a que chega mais perto do relacionamento entre os dois é o de Tintin e Milu. Porém nem essa se aproxima tanto. O mergulhador e seu amigo peixe têm realmente uma amizade, um companheirismo, como se fossem amigos de infância, não só uma coisa de parceria, ou mesmo uma relação de dono-pet.
E os temas clássicos de outras obras de Morrison aparecem mais uma vez. Misticismo, grupos de conspirações políticas, domínio global por organizações gananciosas, paranóia.
Tudo colocado de um modo muito interessante e com a ajuda dos desenhos sensacionais de Cameron Stewart. As ilustrações limpas e “inocentes” de Stewart casam perfeitamente com a estética do quadrinho, mais até, é parte importante desse tema da falsa realidade em que vive o Seaguy, e que talvez todos nós vivemos.
“Seaguy” tem apenas 3 edições, mas Morrison já lançou uma continuação (que eu não li). É uma história emocionante e singela, ao mesmo tempo em que cutuca em diversas feridas da sociedade, e tem um dos finais mais amargos que eu vi recentemente (quem viu Easy Rider sabe mais ou menos do que eu falo).
Faça um favor a si mesmo e leia essa grande obra! Nota 10/10.


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